Direito do Consumidor

A eterna busca pelo descompasso

Julho/Agosto 2022

Cristiane M Santos

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Cristiane M Santos

Há poucos dias (da data em que escrevo esta coluna), tomei conhecimento de que deputados querem acelerar a vo- tação na Câmara de um projeto de lei que altera a Lei de Arbitragem. Como defensora e entusiasta de meios adequados – e consensuais - de resolução de con- flitos, penso que este assunto merece destaque e a atenção de todos, pois as alterações pretendidas podem representar um retrocesso e tirar o Brasil do cenário de arbitragens internacionais.

Prevista pela lei 9.307/96, a arbitragem consiste num meio de solução de conflitos, no qual as partes escolhem um terceiro imparcial, denominado árbitro, ou uma entidade privada (câmara arbitral) para solucionar a controvérsia, sem a participação do Poder Judiciário.

A arbitragem compõe o sistema multiportas de acesso à justiça e é um método extremamente importante e utilizado no processo de desjudicialização que o Brasil vem sofrendo nos últimos anos.

Vale lembrar que desjudicializar é incentivar a resolução de conflitos por meio de métodos adequados nos quais se resolve a controvérsia sem o ingresso de uma ação judicial e, por consequência, uma decisão de um juiz. E são exemplos desses métodos a negociação, a conciliação, a mediação, as práticas colaborativas e a arbitragem.

Como já escrevi em outra oportunidade, destaco que esses métodos não existem para substituir o método tradicional de utilização do sistema judiciário, mas sim para auxiliá-lo, propiciando uma alternativa às pessoas físicas ou jurídicas que buscam soluções diferenciadas e específicas para o seu conflito. São legítimos, previstos em lei, mais econômicos, e a decisão resultante tem força de sentença judicial, podendo ser, inclusive, homologada por um juiz.

Voltando especificamente à arbitragem, trata-se de uma opção que poderá ou não ser utilizada pelas partes, não sendo compulsória e podendo apenas ser convencionada por pessoas maiores e capazes e com relação a direitos disponíveis.

Nesse sentido, no âmbito consumerista, cláusulas contratuais que prevejam a arbitragem compulsória serão nulas de pleno direito!

Outras características da arbitragem – e dos outros métodos – são: a informalidade e a celeridade em comparação ao Poder Judiciário, que pode demorar muitos e muitos anos para proclamar uma sentença.

Mas, afinal, o que o novo projeto de lei pretende alterar?

Basicamente, as modificações consistem em limitar a atuação do árbitro e determinar que as decisões sejam publicadas na íntegra.

De acordo com o que foi veiculado pela imprensa, a deputada Margarete Coelho (PP-PI), autora do projeto de lei, afirma que “a ideia é aumentar a segurança jurídica e coesão das decisões, diminuindo-se o risco de tribunais distintos decidirem demandas idênticas em sentidos opostos”.

Aqui cabe ressaltar que as partes que buscam a arbitragem (e os outros métodos mencionados neste texto) buscam soluções diferenciadas e específicas para seus conflitos, não uma decisão generalizada que não leva em conta as peculiaridades de cada caso como, infelizmente, tem ocorrido no Poder Judiciário.

Além disso, a busca por uma “coesão” poderia levar ao questionamento de sentenças no Poder Judiciário, via que se busca evitar ao escolher a arbitragem.

Outro ponto sensível que o projeto de lei quer modificar é a publicidade das decisões. Apesar da lei em vigor ser omissa quanto ao tema, o Brasil segue as práticas internacionais, que tornam a arbitragem um processo confidencial.

A quebra da confidencialidade em causas complexas e de alto valor, por exemplo, pode afetar o mercado, causar desestabilidade na economia, e, certamente, tirar o Brasil do cenário da arbitragem internacional.

Daí eu pergunto: qual o motivo e a necessidade de restringir a liberdade das partes, de limitar o instituto da arbitragem e, pior, buscar sempre estar em descompasso com o que se faz no resto do mundo?



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