Varejo 4.0

Erica Franquilino

Varejo 4.0

Sem atritos

Mercado cosmético

O Avanço dos dispositivos móveis 

O Fenômeno Amazon 

 

matéria publicada na revista Cosmetics & Toiletries Brasil, Mai/Jun de 2019, Vol. 31 Nº 3 (pág 13 a 15)

 

Varejo 4.0

     Mudanças comportamentais e novas tecnologias estão alterando as formas de comercializar e adquirir produtos e serviços nos últimos anos. A integração de ferramentas e canais de venda, a adaptação de modelos de negócio e as parcerias com startups fazem parte do cenário de reinvenção do varejo.

     Eduardo Terra, presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), explica que o varejo 4.0 “é aquele que está muito próximo do topo da transformação digital. São exemplos a Amazon e o Magazine Luiza, empresas que estão a caminho de se tornarem 4.0. É um varejo que faz a interface com o cliente em todos os canais”.

     A transformação digital, que impulsionou a integração entre pontos de venda offline e on-line, precisa estar atrelada a um plano estratégico consistente. Nesse planejamento, “o digital não é um fim em si, mas um meio de melhorar a produtividade, integrar, otimizar e agilizar a cadeia produtiva, além de simplificar processos e entregar mais valor ao cliente final”, aponta o estudo Transformação digital no varejo brasileiro, da SBVC.

     Segundo o estudo, que pesquisou as ações dos maiores players em sete segmentos (dentre os quais está o de Drogarias e Perfumarias), a transformação digital é prioridade para 54% dos varejistas, posicionamento que abrange o desenvolvimento de estratégias, investimentos e ações específicas.

     “A transformação digital impõe uma revisão no modelo de negócio. O processo começa em definições estratégicas para a empresa, depois avança para a escolha de tecnologias ou de startups que possam atender o que foi previsto no plano estratégico. Na sequência, trata da adaptação das novas tecnologias à infraestrutura existente, para finalmente chegar ao consumidor final e proporcionar uma experiência livre de entraves operacionais e de atritos”, explica Ricardo Pastore, coordenador do Núcleo de Varejo e do Retail Lab da ESPM-SP.

     Terra, da SBVC, destaca que “o jeito de fazer” marketing mudou, “assim como o jeito de fazer lojas”. “As lojas hoje estão parte na internet e parte em espaços físicos, e isso acarreta uma pressão por digitalizar o negócio, por transformá-lo em algo mais eficiente e produtivo”, afirma.

     Nesse panorama, cresce a representatividade das startups, empresas que podem oferecer uma ponte entre o varejo e as novas tecnologias. A edição 2018 da pesquisa Loja 4.0: Panorama das startups brasileiras que estão transformando o varejo, desenvolvida pelo hub de inovação OasisLab, em conjunto com a Startse e a Neomode, aponta a existência de 193 startups brasileiras que já estão criando softwares e hardwares para varejistas no país.

     De acordo com a pesquisa, a atuação das startups abrange as áreas que concentram as grandes transformações e tendências do setor varejista: logística, internet das coisas, operação, pagamento, sustentabilidade, realidade virtual, inteligência artificial, e-commerce e engajamento do consumidor.

 

Sem atritos

     A grande tendência apontada por especialistas é proporcionar ao consumidor uma experiência livre de atritos. “Atrito é tudo aquilo que torna a experiência algo ruim. A fila é um atrito, assim como não encontrar preço e informação sobre o produto. A tecnologia deve sustentar uma experiência com o menor atrito possível”, destaca o presidente da SBVC.

     Para melhorar a experiência de consumo, empresas investem em soluções para mapear a jornada de compra do consumidor, que são as etapas pelas quais ele passa antes de efetuar a aquisição do produto. Em síntese, elas abrangem o conhecimento, a avaliação e a decisão de compra. No entanto, esse processo ganha características cada vez mais fluídas e diversificadas. “As novas tecnologias facilitam a jornada de compra para o consumidor, oferecendo pontos de contatos interativos e opções de personalização e hiperconveniência”, diz Pastore.

     A convergência entre ações de lojas físicas, virtuais, aplicativos, ferramentas digitais e redes sociais – que caracteriza o sistema omnichannel – confere maior agilidade a entregas, trocas e devoluções. As guide shops, por exemplo, unem as comodidades das lojas virtuais (como os preços competitivos) à interação antecipada com os produtos. O cliente pode obter informações sobre o artigo no ambiente virtual, experimentá-lo em uma loja e, em seguida, recebê-lo em casa.

     O conceito – que é tendência no varejo de moda – é a proposta da Amaro. A marca de moda feminina foi criada no Brasil pelo suíço Dominique Oliver Schweingruber em 2012, como comércio eletrônico. Hoje há dezenas de lojas-conceito espalhadas por todo o país. Na Amaro, não existem intermediários – como fornecedores e distribuidores – entre a marca e a cliente final. Criadas com o objetivo de gerar conhecimento da marca, as lojas físicas não têm estoque, nem caixas. Clientes experimentam as peças – contando com o auxílio de consultores de estilo –, podem finalizar suas aquisições utilizando os tablets ou computadores disponíveis na loja e recebem as compras em casa.

     Dentre as diversas opções oferecidas pela Amaro, é possível usar o aplicativo da marca para concluir uma compra que teve início na loja física e receber o produto em casa ou comprar on-line e retirar o pedido na guide shop mais próxima, com frete grátis.

     A reinvenção do varejo também passa pela modernização da venda direta, que adquiriu novos formatos. “Esse modelo de negócio sobrevive encontrando oportunidades para melhorar sua performance, por meio das novas tecnologias digitais disruptivas”, afirma Pastore. A Natura, que nos últimos anos vem expandindo e integrando seus canais de venda, passou a oferecer propostas de negócio adaptadas aos diversos perfis de consultoras.

     “Ao reconhecer que muitas consultoras optavam por um trabalho mais próximo do varejo, abrimos a possibilidade de essas pessoas terem seu próprio negócio, como franqueadas do modelo Aqui Tem Natura. Essa rede de franquias foi criada para as consultoras que têm pontos de venda fixos”, explica Murillo Boccia, diretor de negócios digitais da Natura. Em 2018, foram abertas mais de 100 lojas nesse modelo, que atualmente soma mais de 200 unidades. “Essas lojas atendem ao consumidor que busca experimentação e a conveniência de lojas em locais de alto fluxo”, acrescenta.

     Por meio do aplicativo Consultoria, revendedoras acompanham pedidos e têm acesso a ferramentas de administração de negócios e treinamentos on-line. O aplicativo já foi adotado por mais de 800 mil consultoras no Brasil e na América Latina. O objetivo é chegar a 1 milhão neste ano. Segundo Boccia, as ferramentas digitais oferecidas pela plataforma possibilitaram às consultoras um aumento médio de 15% em suas vendas.

     No que diz respeito ao varejo de beleza brasileiro como um todo, Terra, da SBVC, acredita que ainda há muito a ser desenvolvido no setor. “Temos um mercado bastante avançado em produtos, mas não em varejo. Não é um mercado consolidado como nos Estados Unidos, onde redes de perfumaria têm grandes percentuais de mercado. No Brasil, o varejo de beleza ainda é um mercado pulverizado, formado por médias e pequenas empresas, que estão buscando entender a transformação digital e o varejo 4.0”, opina.

     Para Pastore, o varejo de beleza no Brasil “é um artesanato”. “É difícil padronizar e estabelecer processos que possam ser replicados em diversas unidades da mesma rede, por exemplo”, aponta o professor. Ele destaca que a tecnologia digital disruptiva é fundamental para a transformação desses negócios, “desde os processos de gestão e operações, até a administração de um plano de relacionamento com os clientes”.

 

Mercado cosmético

     Em março deste ano, a marca O Boticário apresentou O Boticário Lab, uma loja “absolutamente imersiva” localizada em Curitiba, no Shopping Pátio Batel. O espaço foi elaborado para estimular os sentidos e proporcionar uma jornada impactante aos consumidores.

     Os visitantes têm acesso a tecnologias como realidade aumentada (que os “transporta” para os países fornecedores de matérias-primas da marca), espelho interativo de maquiagem (para acessar tutoriais de make e gravar seu próprio “antes e depois”), sistema omnichannel e pagamento com celular, além de outras ferramentas que serão implantadas. Membros do programa de fidelidade Clube Viva têm atendimento personalizado e direcionado às suas preferências.

     A marca selecionou cinco das suas criações de perfumaria fina para lançar com exclusividade em O Boticário Lab: 214 Rose Magnifique, 214 Black Vanilla, 214 Wood & Ambar, 214 Spicy Wood e o 214 White Neroli. O espaço também foi escolhido para o lançamento da fragrância masculina The Blend. Um dos destaques da loja é o ambiente destinado aos momentos importantes da marca, com a exposição de objetos originais do acervo da empresa.

     A Natura deu início à abertura de lojas próprias em 2016. Atualmente, existem 38 lojas da marca no país, que buscam atender ao público mais urbano e jovem. “Além das lojas próprias, temos outras formas de presença no varejo, que funcionam como um laboratório para aprendizado. Uma delas é a venda da linha Sou em farmácias. Estamos em mais de 3.800 drogarias, em várias regiões do país”, diz Boccia.

     A plataforma on-line, que começou a operar em 2014, abriga páginas de consultoras, que vendem diretamente a seus clientes por meio do site. “São mais de 500 mil consultoras cadastradas, no Brasil e na América Latina. O canal virtual da Natura já é o líder no setor de cosméticos no Brasil e, em 2018, foi eleito a melhor loja on-line do país pela Ebit”, acrescenta. Segundo o executivo, o e-commerce tem uma base de cinco milhões de consumidores registrados. Cerca de um terço deles têm menos de 30 anos.

     “Buscamos enriquecer a experiência de compra do usuário por meio da omnicanalidade voltada à experiência e à relação, tornando-a cada vez mais integrada ao conteúdo oferecido pela empresa no mundo digital”, destaca.

     Ele menciona como exemplo uma parceria recente estabelecida com o Pinterest, “quando pincodes foram disponibilizados na loja da Natura no Shopping Villa Lobos, em São Paulo. Os consumidores que visitaram a loja acessaram conteúdos exclusivos, ao mesmo tempo em que experimentavam os produtos”. A Natura também está desenvolvendo formatos nos quais “é possível iniciar a jornada de relacionamento em um formato e finalizar a compra em outro”, comenta o diretor.

     Em abril deste ano, a rede de farmácias Panvel, que tem forte atuação na comercialização de itens de higiene e beleza, instalou lockers em pontos estratégicos para a retirada de produtos comprados pelo site ou pelo aplicativo da marca. Os armários inteligentes operam em 11 cidades: São Paulo, Porto Alegre, Curitiba, Florianópolis, Eldorado do Sul, Pelotas, Novo Hamburgo, Rio Grande, Pelotas, Londrina e Caxias do Sul.

     Os armários foram instalados na parte externa de lojas localizadas em ruas de grande circulação e fácil estacionamento. Para usar a solução é preciso sinalizar no momento do checkout, clicando na opção “retirar no locker”. Quando o pedido é colocado no armário, uma mensagem é enviada para o cliente, avisando que o item está disponível para retirada. O consumidor recebe uma senha para abrir a porta do armário.

     No total, são 15 lockers próprios da Panvel em operação, além de cinco armários compartilhados em São Paulo – incluindo os que foram instalados em condomínios residenciais. A empresa pretende instalar mais quatro lockers ainda este ano.

 

O Avanço dos dispositivos móveis 

     Provedores de comércio eletrônico criam estratégias específicas e exclusivas para usuários de smartphones, cuja participação cresce expressivamente no e-commerce. Segundo levantamento feito pela Ebit|Nielsen, as compras efetuadas via smartphones corresponderam a mais de um terço do total de pedidos do comércio eletrônico no Brasil em 2018.

     No ano passado, em média, 35% dos pedidos (40,3 milhões) e 31,3% do faturamento do setor (R$ 16,7 bilhões) foram provenientes do m-commerce, como é chamada a venda on-line realizada via dispositivos móveis.

     A consultoria aponta que o m-commerce é um dos principais responsáveis pelo crescimento nominal de 12% registrado pelo comércio eletrônico no ano passado. As categorias responsáveis pela alta de pedidos no m-commerce foram: Perfumaria, Cosméticos & Saúde (com 51% de crescimento), Informática (27%), Alimentos & Bebidas (23%), além de Moda & Acessórios (6%), Esporte & Lazer (10%) e Casa & Decoração (16%).

 

O Fenômeno Amazon 

     Com uma vasta e diversificada seleção de produtos, rapidez nas entregas, preços baixos e o serviço de assinatura “Prime”, a gigante do e-commerce vem provocando o que especialistas em varejo chamam de “efeito Amazon”. Esses efeitos têm múltiplos aspectos, que vão desde a corrida de grandes empresas por tecnologias de ponta para manter a competitividade a estudos sobre os impactos da atuação da empresa na dinâmica de inflação do mercado norte-americano.

     Segundo a IDC, empresa de consultoria e pesquisa de mercado, a Amazon investiu mais de US$ 13,6 bilhões em tecnologia no ano passado. A Alphabet, controladora do Google, e o Walmart ficaram, respectivamente, com a segunda e a terceira posições.

     Em março deste ano, a Amazon apresentou a Belei, sua primeira marca de skincare. O lançamento é composto por 12 produtos destinados a diversos tipos de pele, para tratar problemas como acne, linhas finas, rugas, manchas escuras, desidratação e oleosidade. Todos os produtos – livres de parabenos, ftalatos, sulfatos e fragrâncias – são vendidos em embalagens feitas de materiais reciclados e recicláveis.

     Os produtos Belei têm envio gratuito nos Estados Unidos, com preços que variam de US$ 9 a US$ 40. Dentre outros produtos, a linha inclui lenços e máscaras faciais, um hidratante facial com FPS 50 e séruns formulados com ácido hialurônico e vitaminas C e E.

 

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