A origem da desigualdade entre os homens

A origem da desigualdade entre os homens

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Edição Atual - Microbioma

Microbioma


Autor: Jean-Jacques Rousseau
Editora: Penguin & Companhia das Letras



A origem da desigualdade entre os homens
A busca continua

por Carlos Alberto Pacheco


Em um de seus escritos, ao lado do posterior “O Contrato Social,” Jean-Jacques Rousseau incendeia a mente dos iluministas da metade do século XVIII com a obra “A origem da desigualdade entre os homens” (Editora Penguin & Companhia das Letras).

O tema ainda é de suma importância, visto que apesar das iniciais abordagens por pensadores da idade antiga, como o clássico “A República” de Platão, passando por Thomas More – “Utopia” (período da Renascença), atravessa toda a idade moderna europeia e acaba por subsidiar às origens conceituais do socialismo na idade contemporânea com a sua farta literatura sobre o tema (por exemplo, “O manifesto comunista” de Karl Max). Como prova atual da importância do assunto mencionado, aponto o risco global mais provável e de maior impacto de ocorrer nos próximos dois anos identificado pelo WEF (Fórum Econômico Mundial) publicado em janeiro de 2023: a “Crise do custo de vida” – que só faz aumentar a atual desigualdade social.

A natureza do discurso de Rousseau trata de estabelecer a diferença entre os dois diferentes tipos de desigualdade: a natural (física, estabelecida pela natureza, como idade, saúde, força física etc.) e a moral (política, oriundas das convenções sociais e que “... consiste nos diferentes privilégios de que alguns desfrutam em prejuízo de outros, como o de ser mais ricos, mais honrados, mais poderosos do que estes, ou mesmo o de se fazer obedecer por eles” – transcrito).

Rousseau, para desenvolver sua ideia, retrocede até a origem da humanidade e parte do conceito de “estado de natureza”, período em que o homem era de fato completamente livre e feliz, não podendo ser considerado bom ou mau, visto que nesse estágio da vida humana não havia nenhuma espécie de relação moral entre os homens. Somente a partir da ideia de propriedade, desenvolvida pelo homem, é que a infelicidade e a desigualdade humana tomam forma, pois é aqui que a diferença moral acaba por se instalar pela primeira vez nas relações humanas: a posse - causadora da diferença entre proprietário e não proprietário, originadora do “bem material”.

O autor também coloca um questionamento sobre a força motriz que tira o homem do estado de natureza para o estado civilizado: o progresso. Ele se pergunta “... se o progresso dos seus conhecimentos [do homem civilizado] é uma compensação sufi ciente dos males que eles se fazem mutuamente, à medida que vão se instruindo sobre o bem que deveriam se fazer, ou se não estariam, tudo devidamente pesado, numa situação mais feliz se não tivessem nenhum mal a temer nem bem a esperar de ninguém, ...”. Rousseau inquieta o espírito humano com essa indagação, pois segundo ele, foi o progresso que fez o homem sair do estado de natureza regido pelo pensamento “faz aos outros o que queres que façam a ti mesmo” para um estado civilizado sob a égide mais imperfeita do que essa, porém mais comum para o homem em sociedade, “faz teu bem com o menor mal possível aos outros”.

Quanto mais ele refl ete sobre a indagação, mais ele se aproxima da formação da opinião: “... o estado de natureza, ..., o melhor para o homem e do qual ele deve ter saído por algum funesto acaso que jamais deveria ter acontecido para a utilidade comum, ..., cada um dos progressos ulteriores foi, aparentemente, um passo rumo à perfeição do indivíduo, mas, na verdade, um passo rumo à decrepitude do homem”. Essa visão pessimista da sociedade humana com certeza tinha os pés bem calçados na desigualdade da humanidade que o Antigo Regime, regido pelas monarquias absolutistas, oferecia a raça humana.Após passar pela descrição do avançar do homem em sociedade, seu escrito inspirou atualmente frases como “pais ricos produzem filhos pobres”, ou “tempos difíceis formam homens fortes, tempos fáceis, homens fracos”, pois ali o autor descreve alguns malefícios da posse material herdada sem a transmissão da herança da conquista moral da propriedade.

Por fi m, ele conclui em suas palavras finais: “... a desigualdade ... tira sua força e seu crescimento do desenvolvimento das nossas facudes e dos progressos do espírito humano, tornando-se enfi m estável e legítima pelo estabelecimento da propriedade e das leis ... Segue-se também que a desigualdade moral, ... é contrária ao direito natural”. Considero o tema deste discurso como uma questão relevante, porém foi uma pena que Rousseau tenha apenas dissertado sobre o desenvolvimento da desigualdade humana e tenha deixado de lado uma proposta de solução para o problema, que com certeza passa por uma refl exão baseada no pensamento de Jeremias, Capítulo 23, Versículo 10: “... Não cabe ao homem nem mesmo dirigir os seus passos”.

Em linha com o tema, sugiro a leitura de “A República” (Platão, Editora Lafonte), “Utopia” (Thomas More, Editora Martin Claret) e “O Contrato Social” (Jean-Jacques Rousseau, Editora L&PM)