Autor: Michael Mosley e John Lynch
Editora: Zahar
A opinião da maioria não importa
A ciência não é democrática.
por Carlos Alberto Pacheco
É isso o que Michael Mosley, economista, médico, jornalista, produtor executivo e apresentador de programas de divulgação científica da prestigiada cadeia televisiva da BBC defende em seu livro, excelentemente ilustrado, Uma história da ciência. De acordo com esse autor, guiar-se pelo consenso é um risco que não se deve correr. Nesse aspecto, a “ciência não é democrática” em virtude de muitas verdades científicas serem contraintuitivas e indiferentes à nossa experiência cotidiana.
Quem somos? De onde viemos? De que somos feitos? O que há lá fora e bem aqui, embaixo de nossos pés? Estas e muitas outras perguntas dessa natureza são feitas pela humanidade desde que criamos a capacidade de nos questionar. A história de como tentamos responder a esses questionamentos é também a história da ciência. Os livros de divulgação científica ajudam a afofar o terreno das nossas mentes nessa épica aventura. Porém, faz-se necessário um alerta importante: não esperemos respostas fáceis, pois não há respostas fáceis. Ao concluirmos a leitura de um bom texto científico, devemos ter mais perguntas do que certezas.
Dessa forma, Mosley subliminarmente nos lembra que o conhecimento avança por meio de boas perguntas e não com verdades rasas. O esforço árido na busca de respostas a essas perguntas não deve nos afastar de fazê-las, pois o avançar da humanidade rumo ao conhecimento passa por esses questionamentos.
No entanto, por que o nome do livro de Mosley é Uma (e não “A”) história da ciência? A resposta é: Porque não há uma única história a ser contada. A narrativa a ser enxergada dependerá do ângulo pelo qual abordarmos um assunto científico, porém sempre teremos uma surpreendente narrativa.
E é assim que o livro de Mosley se desenrola. Nele, o autor coloca os eventos científicos dentro do seu momento histórico (ideias religiosas, políticas e científicas circulantes da época, grau de desenvolvimento econômico e de liberdade de expressão, etc.), deixando claro que o conhecimento científico não ocorre deslocado da realidade do momento em que ele surge. Os formuladores do conhecimento estão tão sujeitos às pressões e influências culturais quanto aqueles que vivem em seu entorno. Aspectos da personalidade das pessoas, os quais vão desde a pura paixão pelo saber até o ávido apetite pelo lucro, determinam por que certos fatos ocorrem em uma época e em um lugar específicos.
Como exemplo disso, menciono o relato que o autor faz, em seu livro, das motivações de alguns exploradores botânicos do século XVII, os quais primeiramente tinham como alvo a busca de espécies comercialmente interessantes, mas nessa busca de viés econômico, acabaram, por arrasto, trazendo para a humanidade conhecimentos científicos que mudaram a nossa visão de mundo. Notemos que a busca pelo ouro verde trouxe para o mundo científico o cacau, que foi identificado botanicamente na Jamaica pelo naturalista britânico Hans Sloane (1660-1753) e rendeu-lhe muito lucro em Londres quando ele patenteou uma mistura de “cacau com leite”. Problemas econômicos estavam sendo causados às plantações de tabaco “por algo” que, pela falta de um nome melhor, foi denominado pelo matemático alemão Adolf Mayer, em 1886, como uma “doença”. Isso abriu as portas para o surgimento da ciência da virologia, para a caracterização do primeiro vírus identificado: o TMV, tobacco mosaic virus. Notemos que o vírus era uma entidade biológica até então desconhecida, embora naquela época sua descoberta estivesse alinhada às pesquisas do cientista francês Luis Pasteur. Problemas, oportunidades, paixões – tudo junto e misturado.
O livro de Mosley é organizado por eixos temáticos, podendo ser consumido linearmente, ou por temas específicos. É organizado em seis grandes blocos – Cosmo, Matéria, Vida, Energia, Corpo e Mente – e descreve pessoas, equipamentos, necessidades, dificuldades e ideias contrárias, sempre com o intuito de deixar claro que o método científico se baseia em dados. Quando surgem novos elementos que não se encaixam no modelo ora proposto, é preciso mudar a explicação. Por mais questionáveis que sejam as motivações das pessoas e por mais influentes que se mostrem as forças econômicas, políticas e individuais atuantes sobre as pessoas que praticam, e por mais intoleráveis que possam ser suas conclusões, o desenvolvimento do saber depende de seguir o ritmo ditado pelas evidências.
Longe de usar um linguajar técnico que possa inibir a leitura de seu livro, Mosley traz verdades profundas, de forma clara, para um público leigo que sente a necessidade de entender melhor nossa existência.
Você está atrás de um excelente livro de divulgação científica? Então você o encontrou.
Em linha com o tema do livro de Mosley, sugiro a você a leitura das obras O universo elegante (Brian Greene, editora Companhia das Letras) e Os elementos (Theodoro Gray, editora Blucher).