Aplicações de Polímeros em Composições Capilares de Tratamento

 

L Rodrigues, C dos Santos Cerqueira Pinto, E Pereira dos Santos, CR Elias Mansur
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro RJ, Brasil

 

Cabelo  

Queratina  

Formulações Capilares Cosméticas 

Polímeros em Formulações Cosméticas  

Considerações Finais   

Referências

artigo publicado na revista Cosmetics & Toiletries Brasil, Mar/Abr de 2019, Vol. 31 Nº 2 (pág 40 a 54)

     O cabelo humano vem sendo estudado ao longo dos tempos por causa de sua importância, que é tanto social como biológica. Desde a Antiguidade até os dias de hoje, cuidados têm sido dedicados à fi bra capilar. Biologicamente, pode-se dizer que o cabelo é basicamente composto de proteínas estruturais, sobretudo de queratina, e de lipídeos. A queratina pode ser constituída de oito aminoácidos, sendo a cisteína o mais abundante, representando 18% do total de aminoácidos.9,18 A queratina é uma proteína resistente e pouco reativa, e é responsável pelo suporte mecânico do cabelo, sendo quimicamente composta de carbono, hidrogênio, nitrogênio, oxigênio e enxofre.26,44

     Diferentes técnicas podem ser utilizadas na caracterização da fibra capilar. Entre elas se destacam: a microscopia em suas diversas vertentes, a análise calorimétrica e os ensaios mecânicos. Desse modo, podem-se observar a morfologia capilar, sua composição, as subestruturas presentes e as propriedades mecânicas e térmicas. Por meio do estudo da fibra capilar, é então possível desenvolver produtos cada vez mais eficientes para o cabelo.4,20,24,26,35

     Existem diferentes formulações capilares disponíveis no mercado para o tratamento do cabelo. Na composição de muitos desses produtos são utilizados polímeros por causa da versatilidade dessas macromoléculas. Geralmente, o tipo mais comum de polímero utilizado é o silicone, muito usado em shampoo e condicionadores. Os polímeros também podem ser utilizados em formulações capilares como tensoativos catiônicos, pois essa macromoléculas têm a característica de neutralizar as cargas negativas da fibra capilar, o que resulta no aumento da penteabilidade do cabelo.

     Os polímeros ainda podem ser utilizados como espessantes em produtos cosméticos, melhorando sua aparência e/ou a facilidade de sua aplicação.14,30,38

      Diante desses aspectos, neste trabalho será apresentado um levantamento bibliográfico sobre as fibras queratínicas, mostrando estudos sobre sua composição, os métodos de sua caracterização e as principais formulações capilares, e os polímeros mais comumente utilizados na higienização e no tratamento da fibra capilar.

 

Cabelo

     Desde o início dos tempos, o cabelo tem tido grande importância para os seres humanos. Segundo Halal (2015), nossos mais primitivos ancestrais viam no cabelo uma forma de se manter aquecidos.18 Cleópatra sempre é retratada com cabelos brilhantes e bem-cuidados. Na Bíblia, o personagem Sansão é retratado como um homem forte devido aos seus cabelos. O nascimento de Vênus, quadro do pintor italiano Sandro Botticelli, retrata uma mulher com longos cabelos. Inúmeros exemplos ao longo da história nos mostram como o cabelo é importante para a sociedade em geral.

     A função do cabelo e do couro cabeludo é basicamente de proteção contra agentes externos, como radiação, abrasão mecânica e queimaduras solares, mas o cabelo também está associado à regulação térmica e é usado como adorno.38

     Segundo Dias (2015), o cabelo é um sistema integrado com comportamento físico e químico peculiares, sendo composto de diferentes estruturas morfológicas complexas que agem em unidade.11

O cabelo é basicamente dividido em cutícula, córtex e medula (Figura 1). A cutícula protege o córtex e é composta de cutículas sobrepostas umas sobre as outras, cujas formas e tamanhos variam. Sem a cutícula dura, que protege o córtex e a medula, o cabelo cairia. Além disso, a cutícula age como uma barreira para produtos químicos e, com o aumento do pH e/ou da temperatura, ela pode se abrir facilitando a entrada desses produtos no interior da fibra. Essa estrutura, a cutícula, é transparente, sendo a melanina, presente no córtex, a responsável pela cor do cabelo. A camada mais externa da cutícula é também chamada de epicutícula, que é uma estrutura hidrofóbica. A proteção da cutícula contra a água também é dada pelo ácido 18-metil eicosanoico (18MEA), que fica subjacente à epicutícula. Ao ser danificado, o cabelo perde sua camada hidrofóbica. Dessa forma, o cabelo fica mais suscetível à entrada de água no interior da fibra capilar, o que aumenta a sensação de ressecamento e a dificuldade ao pentear.14,18,29,40 A medula é a parte central da fibra capilar, não está sempre presente nela e é geralmente encontrada em fios mais grossos.13,18 As células medulares são esféricas e pouco empacotadas, e ao sofrer desidratação, levam à formação de espaços na fibra capilar. Por representar uma pequena porcentagem de massa em relação à fibra e pouca influência nas propriedades químicas e mecânicas do cabelo, a medula é pouco estudada.38 Já o córtex representa cerca de 90% do peso do fio de cabelo e é responsável pelas suas características mecânicas, como flexibilidade e elasticidade, e pela sua cor.18 De acordo com Mano e Mendes (2010), o córtex pode, ainda, ser subdividido em macrofibrila, microfibrila, protofibrila e queratina. A protofibrila seria constituída da α-hélice de queratina, sendo esta, segundo esses autores, “uma haste fibrosa cujo diâmetro varia de acordo com a raça e que é basicamente constituída de células mortas”.31

     Quimicamente, o cabelo é composto de: lipídeos; alguns elementos metálicos, por exemplo, cálcio, magnésio, estrôncio, zinco, potássio, chumbo e titânio, que podem advir de fontes endógenas ou exógenas (como a poluição); e proteínas (que representam aproximadamente 91% do peso total do cabelo).10,18 A queratina é a principal proteína que está presente no cabelo. Pode ser formada por até oito aminoácidos diferentes. Entre eles, destaca-se a cistina, aminoácido sulfuroso que é o principal responsável pela resistência química e estrutural do cabelo.14

     A forma como o cabelo se apresenta é uma característica da etnicidade: os cabelos lisos são em geral os asiáticos, os cabelos que variam do liso ao levemente ondulado pertencem ao grupo caucasiano e os cabelos cacheados ao tipo afro.7 O folículo capilar é o responsável pela produção do fio e por sua forma.39 Quanto mais elíptica for a seção, mais encaracolado será o fio; o cabelo afro é o mais frágil entre os três tipos de cabelo e apresenta uma seção transversal elíptica com o folículo em formato de espira e o fio mais achatado. Por sua vez, o cabelo asiático se apresenta mais resistente e mais grosso em espessura e tem um eixo capilar mais arredondado que os outros tipos de cabelo e o formato dos seus fios é circular. O cabelo caucasiano apresenta, em geral, seção transversal oval e o folículo moderadamente curvo.5,18,27,32

 

Queratina

     De acordo com Robbins (2002), entre 65% e 95% do peso do cabelo é dado pelas proteínas, que são polímeros condensados de aminoácidos.38 “A principal função das proteínas é estrutural, dando suporte mecânico para a membrana plasmática quando esta entra em contato com outras células ou com a matriz extracelular” (USP, 2005).41 A queratina é a principal proteína constituinte da fibra capilar,18 sendo basicamente insolúvel e rica em constituintes sulfurosos.44 Segundo Hwang e colaboradores (2014), esse polímero pode ser classificado em rígido ou flexível e esses dois tipos diferem entre si pela composição dos seus aminoácidos. No tipo rígido (que é o principal tipo de polímero presente no cabelo), observam se maiores teores de cistina, enquanto no tipo flexível isso não é observado.19

De acordo com Mano e Mendes (2010), a queratina se distingue de outras proteínas pelo seu elevado número de ligações dissulfídicas, oriundas das ligações do aminoácido cistina.31 A conformação da proteína se divide em α-queratina e β-queratina. Enquanto a β-queratina apresenta a estrutura de folha pregueada, a α-queratina tem conformação helicoidal e dá sustentação ao cabelo (Figura 2). Materiais queratinosos são sensíveis à tensão e têm forte dependência do efeito da hidratação.31,44

     Quanto às ligações químicas presentes no cabelo, as ligações laterais têm grande importância na estrutura capilar e, segundo Halal (2015), essas ligações são essenciais para “assentar cabelos molhados, estilizações térmicas, relaxamentos químicos e em processos de ondulação permanente”.18 Podem ser divididas em: ligações de hidrogênio, representando um terço da força total do cabelo; ligações iônicas, que são dependentes do pH; e ligações de dissulfeto, que são o tipo de ligação mais forte e que não se rompe com a água ou as variações de temperatura.

 Caracterização da fibra capilar

     Diferentes técnicas podem ser usadas para realizar a caracterização da fibra capilar, dependendo do tipo de informação que se deseje obter. As principais técnicas usadas para caracterizá-la são a microscopia eletrônica de varredura (SEM) e a microscopia eletrônica de transmissão (TEM), a calorimetria exploratória diferencial (DSC), a análise termogravimétrica (TGA), a microscopia de força atômica (AFM) e a microscopia de força de fricção (FFM).

     A principal vantagem do uso da SEM em relação ao da TEM é a maior profundidade de foco que a primeira técnica oferece, fazendo com que esta seja a técnica mais usada. Já a microscopia de força atômica (AFM) não é considerada um tipo de microscopia eletrônica, mas é muito utilizada como complemento da SEM e da TEM, fornecendo dados não apenas morfológicos, mas também da fibra capilar.13,16 Jeon SY e colaboradores (2008) utilizaram as técnicas SEM e TEM para observar a influência dos raios ultravioleta A e B (UVA e UVB) na fibra capilar, avaliando o fio antes e após a exposição ao dano.20 Por meio da técnica de SEM verificaram-se mudanças superficiais na cutícula e, da técnica TEM, mudanças mais profundas na cutícula foram notadas. A Figura 3 apresenta o resultado das análises da TEM.

     Nas imagens, da Figura 3, é possível observar a fibra intacta antes da irradiação e apresentando buracos na estrutura após a irradiação. É possível observar, ainda, que os danos provocados pela radiação UVB são de maior intensidade do que os danos provocados pela radiação UVA. Ambas as modalidades de danos sugerem que esses comprimentos de onda são danosos à fibra capilar, alterando sua estrutura. Esse fato foi explicado pelos autores, Jeon SY e colaboradores (2008), segundo os quais a queratina absorve principalmente o comprimento de onda UVB, o que leva à clivagem das ligações proteicas. A profundidade de penetração desse tipo de radiação seria em torno de 5 μm e, considerando que as camadas da cutícula teriam em torno de 1,8 μm e 5 μm, é possível compreender que o dano causado por esse tipo de radiação fique confinado às camadas mais superficiais da fibra capilar, sendo bastante severo. Já a radiação UVA causou danos mais profundos ao córtex, alterando a estrutura bioquímica dos fios.20

     Nikogeorgos e colaboradores (2010) realizaram estudos da morfologia capilar utilizando a técnica AFM para analisar cabelos virgens e cabelos danificados por diferentes agentes.45 Foram separadas 5 mechas de cabelo de aproximadamente 1 cm de comprimento, coletadas a uma distância de aproximadamente 1 cm da raiz dos cabelos de um mesmo indivíduo caucasiano. Uma mecha de cabelo virgem foi lavada apenas com solução do tensoativo dodecil sulfato de sódio em água deionizada, para a remoção de detritos de sua superfície. A segunda mecha foi danificada com solução de hidróxido de potássio (KOH). A terceira mecha foi descolorida com uma solução preparada com ureia, cloreto de potássio e hidróxido de amônio em água deionizada, misturada a uma segunda solução oxidante de peróxido de hidrogênio. Na quarta mecha foi aplicado um condicionador comercial (cujos principais componentes da fórmula são um sal de amônio quaternário e silicone). A quinta mecha foi danificada por KOH e condicionada com o mesmo condicionador usado na quarta mecha. As imagens e as medidas de fricção foram obtidas tanto em ambiente com umidade quanto seco. As análises de AFM em ambiente úmido encontram-se na Figura 4.45

     Ao analisar as imagens de AFM (Figura 4), observou-se que os cabelos virgens apresentavam estrias típicas de cabelos virgens e detritos provavelmente provenientes da ineficácia da remoção com o tensoativo usado. Nas fibras submetidas aos tratamentos químicos, foi observada a presença de detritos na superfície, porém não foram observadas diferenças significantes entre as topografias dessas amostras que alterassem os valores de coeficiente de fricção. Logo, as diferenças nos coeficientes de fricção foram atribuídas a mudanças na estrutura química dos cabelos. Ao analisar os resultados obtidos em ambiente seco e em presença de umidade, foi observado que em ambos os ambientes o coeficiente de fricção foi maior para as amostras quimicamente tratadas do que para os cabelos virgens; porém, essa diferença se tornou muito maior em ambientes aquosos. Esse fato foi atribuído à perda da camada lipídica hidrofóbica, onde então o cabelo absorveu maior quantidade de água, enfraquecendo a fibra e tornando mais profunda a penetração da ponteira do instrumento, levando ao aumento do coeficiente de fricção.45

     O efeito da umidade do ar em associação ao efeito de condicionadores foi o alvo de uma pesquisa de Bushan e Chen (2006). Utilizando um aparelho comercial de AFM acoplado a uma sonda de silício acoplada a uma força de modulação, esses autores realizaram estudos acerca das forças de adesão e do módulo de Young quando há utilização de condicionadores. Durante os estudos, variou-se o índice de umidade e a temperatura manteve-se constante, e foram utilizadas amostras de cabelos do tipo caucasiano divididos em três grupos: virgem, quimicamente danificado e danificado seguido de tratamento.3

       

Ao analisar as imagens de AFM (Figura 5), os autores observaram que a umidade teve efeito menor em cabelos virgens porque a camada lipídica da superfície estava menos danificada, sendo assim, o módulo de Young foi pouco alterado. Já as forças de adesão foram maiores nesse tipo de amostra por causa das forças de van der Waalls. No cabelo danificado e no cabelo tratado, observou-se a formação de uma camada de condicionador que absorvia maiores quantidades de água à medida que a umidade aumentava. Em baixa umidade do ar, essa camada colapsou e ocorreu formação de domínios isolados de condicionador, como pode ser visto na imagem (Figura 5). Esse aumento da umidade nos cabelos quimicamente tratados levou à diminuição do módulo de Young e foram observadas maiores forças de adesão para ambas as amostras.3

     No cabelo danificado e tratado, a camada de condicionador, embora absorva água, impede que essa água seja drenada para dentro dos fios, o que faz com que essa amostra apresente módulo de Young semelhante ao do cabelo virgem. A diminuição do módulo de Young em função da umidade acontece devido às ligações laterais do cabelo: em alta umidade, o córtex e a cutícula absorvem grande quantidade de água, o que enfraquece as ligações iônicas e de hidrogênio entre as proteínas do cabelo.3

     Bushan e Seshadri (2008) realizaram estudos de AFM juntamente com um teste de tensão-deformação para avaliar as diferenças entre as propriedades mecânicas dos diferentes tipos de cabelo (caucasiano, asiático e afro).5 Na Figura 6, é possível observar a curva de tensão-deformação obtida após a análise das amostras. Nessa imagem, é possível observar diferenças significativas entre os três tipos de cabelo: o cabelo do tipo asiático apresentou o maior módulo elástico, o do tipo caucasiano um módulo intermediário e o cabelo do tipo afro o menor. A região de escoamento presente no gráfico é a região onde houve a conversão da α-queratina em β-queratina. O ponto de escoamento foi significantemente maior para cabelos asiáticos do que para cabelos caucasianos e afro, que apresentaram resultados semelhantes. O alongamento na ruptura também se apresentou mais elevado para o cabelo asiático e mais baixo para o cabelo afro. Os autores observaram que a etnicidade altera as propriedades mecânicas do cabelo. As baixas propriedades mecânicas da amostra de cabelo afro foram atribuídas à característica curva dos fios, que faz com que a tensão para pentea-los e desembaraça-los seja maior.5

     Embora Bushan e Seshadri (2008) tenham usado AFM em conjunto com teste de tensão para ensaios de tensão-deformação, segundo Lee e Kwon (2013), o método mais eficaz para descrever esse tipo de curva e avaliar algumas das propriedades mecânicas do cabelo seria usar um teste de tensão juntamente com a captura de imagens.24 De acordo com os autores, esse método seria mais interessante, pois ele traz os valores reais de tensão-deformação, diferentemente de uma curva de tensão-deformação da engenharia, que não leva em conta as variações de diâmetro da fibra sob estresse. Os testes foram realizados (utilizando uma máquina de microteste TA) com uma célula de 1 kgf e imagens do cabelo foram capturadas ao longo do teste, com 5 quadros por segundo. Os pesquisadores utilizaram cabelo do tipo asiático de um único indivíduo. Ao analisar as imagens, cada pixel foi convertido em aproximadamente 0,37 μm (quando o aumento na imagem foi de 10x) e em 0,095 μm (quando o aumento foi de 40x), e as variações de diâmetro puderam então ser avaliadas. Ao serem comparadas as curvas de tensão-deformação (Figura 7a), observou-se que os valores obtidos por esse método se encontravam em valores mais elevados do que os valores encontrados em ensaios de tensão-deformação de engenharia. A região 1 é referente à região elástica linear, a região 2 à região de transição não linear, a região 3 é a região de escoamento e a região 4 se refere ao rompimento da fibra. A curva representada na Figura 7b apresenta, de forma ampliada,comportamento da deformação nas regiões 1, 2 e 3.

    
     Outras técnicas, além das microscopias, podem ser utilizadas para a caracterização do cabelo. Lima e colaboradores (2016) utilizaram diferentes métodos para investigar a fibra capilar. Entre eles estão a análise elementar (EA), a análise termogravimétrica (TGA) e a DSC. Mechas de cabelo caucasiano, oriental e afro, com peso aproximado de 2 g cada e comprimentos aproximados de 10 cm, foram utilizadas para realizar as análises. As amostras foram tratadas com lauril éter sulfato de sódio e armazenadas, para evitar perda de umidade. Os pesquisadores utilizaram um aparelho de análise elementar para quantificar as porcentagens de carbono, hidrogênio, nitrogênio e enxofre nos três grupos étnicos, comparando os resultados obtidos com um padrão de queratina (Tabela 1).

     A partir da análise em EA, os autores concluíram que o cabelo do tipo afro tem porcentagem menor de hidrogênio do que os outros dois grupos.

     Ao realizar a análise de TGA, os autores obtiveram resultados que corroboraram com os obtidos na análise elementar, apresentando menor quantidade de água e menor o teor de hidrogênio. Por meio da DSC em atmosfera inerte (Figura 8), foi observada a presença de picos endotérmicos bimodais, que estavam relacionados à fusão da α-queratina. Os cabelos do tipo afro apresentaram Tm menor do que os outros dois tipos (variação aproximada de 12°C), o que pode estar associado à maior fragilidade desse tipo de cabelo. Esse resultado também vai de encontro aos resultados obtidos pelas técnicas anteriormente citadas, já que a água seria a responsável por manter a queratina mais estável e resistente à temperatura.26

    Popescu e Gummer (2016), no entanto, discutiram a possibilidade da interpretação errônea de dados obtidos por meio da DSC. Para esses autores, a DSC é uma técnica útil, mas que deve ser usada em conjunto com outras técnicas, como espectrometria de massas (MS) ou espectroscopia de infravermelho com transformada de Fourier, que levam em consideração a composição dos gases liberados na pirólise e podem oferecer resultados mais completos sobre a fibra capilar, e analisados juntamente a outras técnicas, como difração de raios-x e ensaios mecânicos de tensão- deformação. Essa recomendação se deveria às discordâncias entre alguns autores sobre o significado do pico endotérmico, ora classificado como referente à fusão das estruturas α-hélice da queratina, ora classificado como referente ao aminoácido cisteína presente na matriz capilar amorfa.35

     Kempson e Skinner (2005) utilizaram a técnica de espectrometria de massas na modalidade ToF-SIMS para realizar estudos sobre a distribuição elementar ao longo da fibra e como os diferentes íons metálicos ligam-se à cutícula do cabelo. Ao realizar a descoloração da fibra, os autores observaram que a acumulação da maioria das espécies metálicas aumentou e, como justificativa para isso, duas hipóteses foram apresentadas. A primeira delas é que a eficiência de detecção do ToF-SIMS tenha aumentado por causa da oxidação da matriz capilar e a segunda é que a descoloração da fibra favoreça o aumento da capacidade de a cutícula capilar se ligar a espécies metálicas.22

     Por outro lado, Nikogeorgos e colaboradores (2010) utilizaram espectrometria na modalidade SIMS, porém com a proposta de verificar a integridade da fibra capilar antes e após tratamentos químicos, observando a quantidade de ácidos graxos presentes no fio. Os autores observaram que houve remoção parcial de 18-MEA após a exposição ao dano, o que levou ao aumento da característica hidrofílica da fibra. Ao realizar a análise das amostras tratadas com condicionador comercial (os principais componentes dessa fórmula são sal de amônio quaternário e silicone) no mesmo aparelho, observou-se, ainda, que houve a interação das amostras danificadas com o condicionador, concluindo que o fio mais danificado aderiu melhor aos agentes condicionantes, o que está em concordância com os estudos de Bushan e Chen (2005).3,45

 

 Formulações Capilares Cosméticas

 Shampoos

     Os shampoo são formulações cosméticas muito populares e, segundo Powers (1972), eram originalmente um sabão ou mesmo uma mistura de sabões.36 Segundo Barata (1995), os shampoos atuais são, em geral, em forma de líquidos, cremes ou espumas e apresentam propriedades molhantes, detergentes, emulsionantes e formadoras de espuma.2 Os detergentes sintéticos são amplamente utilizados; no entanto, sua função primária permanece a mesma: promover a limpeza dos cabelos e do couro cabeludo.41

      A escolha do detergente é baseada em alguns fatores importantes, como descrito por Wilkinson e Moore (1990), que citam que nove fatores devem ser levados em consideração na escolha do tipo de detergente. São eles: “facilidade de aplicação, poder de espuma, eliminação da sujeira, facilidade de enxágue, facilidade de pentear o cabelo úmido, brilho do cabelo, velocidade desecagem do cabelo, facilidade de pentear e definir o cabelo seco e a segurança do produto”.46

     A capacidade de limpeza do detergente presente nos shampoos é oriunda dos tensoativos, que são moléculas anfifílicas em que a parte polar é capaz de interagir com a água e a parte apolar interage com o sebo produzido no couro cabeludo, levando à formação de micelas (Figura 9).14,18,47

     A proporção em massa entre os grupos polares e apolares em uma molécula de tensoativos indicará qual será o comportamento esperado, dependendo do meio utilizado (meio aquoso ou meio oleoso). Para fazer essa classificação das melhores condições de uso de um tensoativo, foi desenvolvido um sistema de classificação chamado balanço hidrófi lo-lipófi lo (HLB). Nesse sistema, quanto menor for o HLB, mais solúvel em óleo será o tensoativo e, por outro lado, quanto maior for esse valor, mais solúvel em água será o tensoativo.15

     Os tensoativos podem ser de diferentes naturezas: aniônicos, catiônicos, anfóteros e não iônicos. Os do tipo aniônico, que apresentam cargas negativas, são os mais utilizados em shampoos e tem bom poder de limpeza – um exemplo de tensoativo aniônico é o lauril sulfato de sódio. São, em geral, de baixo custo e de fácil preparo, o que justifica seu uso em larga escala. Entretanto, por serem mais agressivos, em geral, são utilizados em combinação com outros tensoativos para amenizar as agressões à fibra capilar. Os tensoativos catiônicos, que apresentam cargas positivas, são em geral utilizados em condicionadores por terem boa afinidade com a queratina presente no fio. Têm propriedades antimicrobianas, neutralizam as cargas negativas deixadas no cabelo após o uso do shampoo e aumentam a penteabilidade dos fios. Os tensoativos anfóteros são aqueles em que a natureza das cargas depende do pH do meio e, embora sejam bem tolerados pelo cabelo, apresentam menor poder de limpeza e de espuma e são geralmente utilizados em formulações para bebês. Os tensoativos não iônicos são aqueles que não apresentam cargas e têm fraco poder de espuma, e em geral são utilizados em conjunto com tensoativos aniônicos para torná-los menos irritantes.18,41

 Condicionadores

     De acordo com Bolduc e Shapiro (2001), os condicionadores têm a função de imitar o sebo que é naturalmente produzido pelo cabelo e é retirado pelo shampoo na hora da lavagem. Assim, os condicionadores apresentam potencial sobre-engordurante, podendo restaurar o brilho e a maciez dos fios.6

     Tanto o potencial sobre-engordurante como a ação antiestética dos condicionadores atuam no aumento da penteabilidade dos fios. O cabelo tem pH entre 4-5 e, após o uso dos tensoativos aniônicos, esse valor pode ser aumentado. Por essa razão, os condicionadores são geralmente formulados com o pH ácido.41

     Além disso, os condicionadores geralmente apresentam cargas positivas por causa da utilização de tensoativos catiônicos. Dessa forma, os condicionadores neutralizam as cargas negativas deixadas pelo shampoo, apresentando ação antiestática, além de aumentar sua aderência às cutículas devido ao baixo ponto isoelétrico do cabelo, aumentando o brilho.12,40 Segundo Evans e Wickett (2012), diversos polímeros catiônicos vêm sendo estudados com a finalidade de condicionar os fios. Entre eles se destacam a quitosana, os sais quaternários de amônio e compostos à base de silicone.14

   A quitosana (Figura 10) é um polímero catiônico, resultado da desacetilação da quitina. Por ser solúvel em água, pode ser usado para as mais diversas aplicações em solução, como: gel, filmes e fibras. No estado sólido, a quitosana é um polímero semicristalino.37 Já os sais quaternários de amônio são compostos derivados de aminas primárias, secundárias ou terciárias e de um haleto de alquila, sulfeto ou outro grupo de saída. Sua fórmula geral é R4N+X-, onde o R representa um radical alquila, arila ou aralquila e o x representa um ânion qualquer.42 Os silicones são polímeros que contêm em sua estrutura átomos de silício e de oxigênio, onde na cadeia principal são encontradas ligações silício-oxigênio ligadas a grupos metila.48 Segundo Robbins (2002), esses polímeros, de modo geral, interagem apenas com a superfície do cabelo.38 As interações químicas entre o polímero e o cabelo se dividem em ligações de valência primária (ligações covalentes e iônicas), interações polares (principalmente de hidrogênio) e forças de dispersão (forças de Van der Waals). No caso dos polímeros de alta massa molar, não apenas essas interações são importantes: a entropia torna-se um fator-chave para que ocorra a interação entre o polímero e a fibra capilar. Quanto maior for o grau de desorganização estrutural, mais facilmente ocorrerá a ligação entre o polímero de alta massa molar e a superfície da fibra.

     Os silicones são muito utilizados em condicionares e, segundo Bushan (2008), esses produtos se depositam sobre a fibra formando um filme que, principalmente em cabelos danificados, impede a drenagem excessiva da água para dentro da fibra capilar.4

     Os silicones têm grande aplicação na indústria cosmética desde a década de 1970. Por serem bastante versáteis, podem ser usados para diversos fins nas formulações, como: aumento do brilho dos fios e da penteabilidade, proteção térmica, proteção da cor, manter o penteado e controlar o frizz. Para que sua ação seja efetiva, o silicone precisa se depositar sobre o fio e essa deposição pode variar dependendo de alguns fatores, como o tipo de silicone empregado, a formulação, o polímero catiônico empregado e a quantidade de lavagens. Geralmente, o que ocorre é o aumento da hidrofobicidade da fibra capilar quando esta é tratada com esse tipo de polímero.48

     Um dos principais compostos à base de silicone utilizado são os silicones quaternários de amônio (Figura 11). Eles podem ser classificados como uma série de compostos que contém grupos alquila e grupos de nitrogênio quaternários graxos em uma única molécula. Esse tipo de composto é muito utilizado em cosméticos por causa de sua ação condicionante.33

     Além de tensoativos, outras substâncias são utilizadas na formulação de condicionadores, como proteínas e seus derivados, álcoois graxos, silicones, umectantes e hidratantes.

 

Polímeros em Formulações Cosméticas

     Mahajan (2016) destacou a importância dos polímeros em veiculações cosméticas, em que são usados com diferentes finalidades, entre as quais se destacam: tensoativos em shampoos e condicionadores, umectantes, produtos para modelagem do cabelo, modificadores de propriedades reológicas e veículos de tinturas.30

     Picard e colaboradores (2013) utilizaram polímeros hidrofílicos diferentes, divididos entre naturais, naturais modificados e sintéticos, para analisar sua efetividade quanto às propriedades reológicas e mecânicas de emulsões.36 Os autores prepararam oito emulsões de óleo em água (O/W) com cerca de 1% m/m de cada polímero, conservantes, hidrocarbonetos, silicones e butilenoglicol. Após a realização dos testes reológicos, eles observaram que os polímeros sintéticos (poli(ácido acrílico) e poliacrilamida) apresentaram maiores valores de tensão de escoamento e maior viscosidade devido à formação de géis com a fase aquosa. A goma xantana apresentou valores altos de viscosidade aparente por causa da estrutura semirrígida que suas moléculas adotam em água. Os testes evidenciaram que os géis preparados com base nas emulsões e com polímeros sintéticos apresentaram-se mais consistentes do que aqueles preparados com polímeros naturais ou naturais modificados. A goma xantana apresentou resultados diferentes em ambos os grupos, pois, embora tenha baixa consistência e apresente um valor intermediário de módulo de elasticidade, apresentou boa deformabilidade, o que, segundo os autores, evidenciou seu poder de aumentar a viscosidade, embora não houvesse formação de géis fisicamente estruturados. Ao fim dos estudos, os autores concluíram que os polímeros sintéticos apresentaram melhores propriedades reológicas do que os polímeros naturais (goma xantana e goma guar) e seminaturais (hidroxi-etil-celulose, hidroxi-propil-gua e hidroxi-propil-metil-celulose). No entanto, os autores pontuaram que a goma xantana, apesar de ser um polímero natural, apresentou características distintas dos polímeros de seu grupo, mostrando boas propriedades reológicas.34

     Embora os resultados de Picard e colaboradores (2013) apresentem os polímeros naturais com propriedades menos interessantes que as dos sintéticos, é necessário pensar que o uso de polímeros biodegradáveis na indústria cosmética apresenta vantagens em relação ao uso dos não biodegradáveis. Os polímeros naturais, em geral, são não reativos com o organismo e podem ser eliminados pelo corpo naturalmente, enquanto os sintéticos podem acumular-se no organismo.1

     Liu e colaboradores (2016) utilizaram polímeros na estilização do cabelo.28 Os pesquisadores utilizaram um filme de poliuretano para desenvolver produtos que mantenham a forma do cabelo após o penteado, como uma espécie de memória; esses produtos são conhecidos como efeito de memória da forma (SME). A preparação do filme de poliuretano foi feita com uma solução contendo o polímero diluído em acetato de etila para 6% em massa. Após a secagem, o filme obtido foi submetido a testes para análise da eficiência do SME e foi observado que o cabelo apresentou recuperação de até 94% à temperatura de 75°C após a deformação, e esse percentual diminuiu à medida que mais deformações foram feitas, chegando a 65% em seu estado final. Ao realizar os estudos nessa temperatura, os autores sugeriram que, mesmo se água quente fosse utilizada nos cabelos, o efeito do filme não seria alterado de modo brusco.

     Voronov e colaboradores (2014) se atentaram ao uso de tensoativos de origem natural como alternativa aos tensoativos sintéticos comumente utilizados, como o lauril sulfato de sódio (SLS). Os autores utilizaram um tensoativo polimérico obtido de óleo de soja (SBPS) e esperavam avaliar se, nas condições de uso, esse tipo de tensoativo teria desempenho comparável ao do SLS.43 A obtenção do SBPS é mostrada na Figura 12.

     Após a obtenção do tensoativo, os autores realizaram estudos para averiguar a capacidade de o SBPS solubilizar substâncias pouco solúveis em água. Para isso, uma tinta hidrofóbica foi adicionada à água e eles observaram que não havia absorção no espectrofotômetro naquele sistema. Ao adicionar o SBPS e medir novamente a atividade óptica, observaram que havia um comprimento de onda na faixa de 547 nm, que foi associado à presença dessa tintura. Os autores, então, confirmaram que essas micelas poliméricas teriam a capacidade de sequestrar moléculas hidrofóbicas em meio aquoso. Os pesquisadores avaliaram também a perda proteica (referente ao dano mecânico causado por pentear o cabelo) após o uso dos shampoos contendo os tensoativos. O SBPS mostrou-se menos agressivo à fibra do que o SLS, principalmente se associado à Aloe vera. Comparado ao controle feito com água deionizada, o SBPS (associado à Aloe vera) reduziu a perda de proteína em até 23,89%, enquanto o SLS (associado à Aloe vera) a reduziu em apenas 0,24%. Ao fim dos estudos, os autores sugeriram que o uso do SBPS seria uma alternativa para diminuir o uso do SLS sem perda da eficiência do produto.43

    Lim e colaboradores (2010) realizaram estudos sobre o efeito de silicones utilizando apenas amostras de cabelo virgem. Comparando o uso do polidimetil-siloxilano (PDMS) e siloxilanos funcionalizados com grupos amino em diferentes concentrações e diferentes ciclos de lavagem, os autores avaliaram as mudanças na topografia da fibra, no brilho e na penteabilidade, e a adesão do silicone ao cabelo.26 Com base nesses estudos, eles observaram que os polímeros funcionalizados com grupamentos amino apresentaram melhores resultados de adesão à fibra, bem como diminuição da força para pentear o cabelo, mesmo quando estavam em menores concentrações do que os silicones não funcionalizados. Esses resultados foram atribuídos à maior absorção desse tipo de silicone pela fibra. Bushan (2008) explicou essa maior absorção como sendo resultado da forte atração desses silicones modificados e carregados positivamente pela superfície negativa do cabelo, já que a interação eletrostática seria mais forte do que as interações de Van der Waals, que geralmente ocorrem entre polímeros não funcionalizados e o cabelo.

    Haake e colaboradores (2007) fizeram um estudo comparativo entre o poder emoliente e de deposição de um hidrocarboneto (o dideceno hidrogenado – Figura 13) e o de silicones.17 O hidrocarboneto estava presente em shampoo formulado pelos autores, enquanto os silicones estavam presentes em formulações comerciais.

     Amostras de cabelo caucasiano foram utilizadas nesse estudo, e cada mecha foi tratada com 1g de shampoo para cada 1g de cabelo. Ao realizar espectroscopia de emissão óptica por plasma acoplado indutivamente (ICP-OES), os pesquisadores observaram que a quantidade de silicone absorvido é quase de  vezes maior do que a quantidade de dideceno hidrogenado absorvido, mostrando que a fibra capilar adere preferencialmente ao silicone do que ao hidrocarboneto. Concomitantemente, com a maior deposição de silicone na fibra, ocorreu diminuição da força necessária para pentear os cabelos. O shampoo com silicone apresentou redução dessa força de aproximadamente 80% com apenas uma aplicação, enquanto o shampoo contendo dideceno apresentou redução de aproximadamente 70%.17

     Jordan e colaboradores (2009) também realizaram estudos sob a deposição de silicone na fibra capilar, porém associado a polímeros catiônicos, e um dos seus objetivos foi avaliar a penteabilidade úmida dos cabelos.21 Os autores utilizaram uma emulsão de silicone não especificada, proveniente da empresa Dow Corning, em conjunto com polímeros poliquatérnio-10 (PQ10) e goma guar catiônica como controle, e outros quatro polímeros diferentes – poliquatérnio 11, 6, 47 e 7 – e duas misturas. As estruturas químicas dos polímeros encontram-se nas Figuras 14 a 16.21

     A força necessária para pentear as mechas de cabelo após o uso dos polímeros foi calculada utilizando um aparato para teste de tensão, por meio do qual a diferença da força necessária para pentear o cabelo com e sem o polímero foi calculada. Os pesquisadores utilizaram a goma guar e o poliquarténio-10 como controle positivo. Entre os polímeros analisados, o poliquartérnio-7 apresentou a maior redução da força para pentear os fios. Esse resultado foi considerado fruto de uma combinação de alta massa molar e alta densidade de carga, o que levou a uma deposição maior do polímero sobre a fibra e, consequentemente, reduziu a força necessária para pentear os fios.22 

     

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

     Kim e colaboradores (2003) sintetizaram um filme polimérico bifásico à base de látex com grupamentos PEG (polietileno glicol) em sua estrutura, com a finalidade da veiculação em produtos para modelar o cabelo.23 O látex foi sintetizado em uma polimerização processada em emulsão sem tensoativos, resultando na molécula da Figura 17.

     As amostras de cabelo receberam tratamento com o polímero, sendo impregnadas em uma dispersão de 1% em massa e pH 6,5. Para observar a formação do filme no cabelo, foi utilizada a técnica de SEM, por meio da qual foi possível confirmar a formação de um filme fino na superfície da fibra capilar. Essa cobertura depende da presença de grupos catiônicos, devido à interação íon-íon entre o cabelo e as cargas positivas do látex. A topologia do filme no cabelo foi analisada usando a AFM, por meio da qual foi observada a presença, de uma camada de estrutura esférica. Os autores acreditam que seja possível a utilização desse tipo de filme em produtos de modelagem do cabelo.23

 

Considerações Finais

     A fibra capilar é majoritariamente constituída da proteína queratina, biopolímero que apresenta características distintas. Representando cerca de 90% do peso total do cabelo, a queratina é formada por diferentes aminoácidos, sendo o principal deles a cisteína, um aminoácido sulfurado.

    De posse das informações sobre as propriedades da fibra capilar, é possível avaliar melhor quais os tipos de produtos que podem ser utilizados para o tratamento dos cabelos. Os polímeros têm sido extensivamente incorporados a formulações capilares. Os tensoativos poliméricos catiônicos mostram ser uma alternativa interessante para tornar os shampoos menos agressivos aos fios, deixando esses produtos mais hidratantes. De origem sintética ou natural, observou-se, por meio dos resultados, que a sua ação condicionante foi satisfatória. Além de ser usados como tensoativos, os polímeros são empregados na forma de silicones e espessantes em formulações cosméticas. Por causa das agressões químicas e físicas sofridas pela fibra capilar, o cabelo pode tornar-se frágil e muito suscetível à entrada de água, levando à sua quebra. Os silicones agem como uma barreira hidrofóbica, aumentando também a maciez e o brilho dos fios. Já os espessantes atuam aumentando a viscosidade das formulações, o que pode torná-las mais atrativas para o consumidor e diminuir a quantidade de produto necessária para aplicação no cabelo.

     Dessa forma, o uso de polímeros para o tratamento de fibras queratínicas mostra-se bastante promissor, apresentando resultados satisfatórios nos estudos já realizados. Em razão da versatilidade dessas macromoléculas, é possível que sejam realizados mais estudos na área, para o aprimoramento das formulações já existentes e a criação de novas formulações com base polimérica.

 

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Lívia Rodrigues é doutoranda no Instituto de Macromoléculas Professora Eloisa Mano (IMA), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Mestre em Ciência e Tecnologia de Polímeros por esse instituto. Atua nas áreas de nanotecnologia e desenvolvimento de cosméticos.

Cristal dos Santos Cerqueira Pinto é pesquisadora em propriedade industrial no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). Doutora em Ciência e Tecnologia de Polímeros pelo IMA, da UFRJ. Participa como coorientadora de mestrado e doutorado no programa de pós-graduação desse instituto, atuando nas áreas de propriedade industrial e de pesquisa, nanotecnologia e desenvolvimento de cosméticos.

Elisabete Pereira dos Santos é professora associada da Faculdade de Farmácia da UFRJ, responsável pela disciplina de Dermocosméticos. Participa dos programas de pós-graduação dessa instituição, atuando na área de desenvolvimento galênico de dermocosméticos e cosméticos.

Claudia Regina Elias Mansur é professora associada e membro do Conselho Deliberativo do IMA, da UFRJ. Pesquisador 1D do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e cientista do estadopela Faperj, tem experiência nas áreas de polímeros e coloides aplicados na indústria de petróleo e no setor farmacêutico.

 

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